quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

JORNADA MÉDICO-PERICIAL EM DEBATE EM 2011

Jornada de trabalho

A duração da jornada de trabalho é matéria em permanente evolução, pois as verdades científicas são efêmeras e a relação capital trabalho gangorra em favorecimento ora de um ora de outro. O tema interessa muito aos ergonomistas e há estudos sobre isso.

A maioria das jornadas são definidas pela experiência, tentativa e erro mesmo. No mundo esportivo pode-se buscar paralelos. Você já se perguntou por que uma partida de futebol tem 2 tempos de 45 minutos com um intervalo de 15? E uma luta de boxe, 3 minutos de trabalho para 1 de descanso? A lógica é a da performance e resistência humana, sem desconsiderar o interesse econômico. Imagine um assalto de boxe de 45 minutos!

O exemplar deste mês do jornal da Associação médica de MG traz entrevista com o prof João Gabriel que cita trabalho em que a capacidade de raciocinar de um médico após 24 hs de plantão se mostrou semelhante a de alguém alcoolizado. Estranhamente esse "dado concreto" (diria Lula) não é levado em conta para nada. Jornadas de trabalho precisam ser desiguais, nada de uma lei única para todos os trabalhos, seria a recomendação de qualquer especialista em ergonomia que, para quem desconhece, é a ciência da adaptação do trabalho às características dos trabalhadores. Tornearia e medicina têm exigências distintas.

A primeira convenção da OIT, adotada no ano de sua fundação, logo após a primeira guerra, trata exatamente da duração da jornada de trabalho.
Após a segunda guerra, com era de valorização dos direitos humanos, a dignidade do trabalho entrou em evidência. A Declaração Universal dos Direitos do Homem da ONU em 1948 prevê no Art.XXIV: "Todo homem tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas".
Mais recentemente, em 1966 a ONU aprovou o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais ratificado oficialmente pelo Brasil. o Art.7o dever destacado aqui: "o direito de toda pessoa de gozar de condições de trabalho justas e favoráveis que asseguram especialmente (...) a limitação razoável das horas de trabalho (...)".

Discutir jornada de trabalho para que os peritos, eles próprios, definam a carga suportável que assegure condições salubres e produtividade é uma necessidade que não pode mais ser negligenciada. É bom que se registre que a meta não é trabalhar menos por vagabundagem, como insinuaria ou afirmaria algum desavisado. Médicos, todos sabem, são talvez os profissionais que mais trabalham, não conheço um único que trabalhe menos de 12 hs por dia e o CFM tem estatísticas sobre isso. A preocupação seria preservar tanto os servidores públicos quanto a qualidade e precisão de seus trabalhos.

Perícia Médica é atividade penosa. Quem faz perícia sofre, e não me refiro aos periciados, que, evidentemente, não se sentem bem sendo interpelados e examinados para que suas alegações sejam apuradas. Ninguém gosta. Neste artigo me refiro especificamente aos peritos, que são médicos por formação, e habituados a agir sempre no melhor interesse do paciente.

Ocorre que perícia médica não é orientada pelo interesse do paciente, mas pela avaliação e julgamento justo dos fatos. O interesse é a justiça social aplicada a cada indivíduo atendido no INSS. O papel de perito é difícil por sua complexidade e penoso por sua natureza, uma vez que exige do médico outras habilidades que se somam às de sua formação (longa, árdua, cara).

Indeferir algo que se sabe ser de extrema importância até mesmo para a saúde do periciado é uma decisão difícil e sofrida que o perito tem o dever (de agente público) de fazer quando os requisitos legais o obrigam.

A escala hierárquica de necessidades de Maslow ensina que, insatisfeitas as necessidades vitais, cidadãos de qualquer formação podem se tornar violentos. O benefício previdenciário, muitas vezes, é requerido (ou mantido) em tais situações, o que expõe o perito a rompantes de violência verbal e física.

Se perícia médica não for atividade penosa, nem uma outra o será, do ponto de vista psíquico. Que o demonstrem os afastamentos para tratamento dos peritos do INSS, que chegam a 50% em algumas gerências, mas cujos dados precisos carecem ser levantados.

Desde a LOPS, Lei Orgânica da Previdência Social, de 1960, já se fala em trabalho penoso e adicional de penosidade. Em 1989 a Lei 7.850 (já revogada) caracterizou a atividade de telefonista como penosa.
A Lei geral do funcionalismo prevê adicional de penosidade para os que trabalhem em fronteira ou condições de vida que o justifiquem (Art. 71, Lei n.8.212/01).
Assim, o adicional de penosidade previsto no Art. 7o da Constituição e nunca regulamentado tem sua existência no mundo jurídico e real inquestionável.

O que interessa aqui discutir é o conceito de penosidade e sua aplicabilidade ao trabalho de peritos médicos do INSS. Como escreveu o jurista, “Os trabalhadores expostos a agentes insalubres, perigosos ou penosos sofrem desgastes acentuados na luta contra fatores nocivos à saúde. Para compensar tais agressões, a tendência moderna aponta no sentido de se reduzir a jornada de trabalho, concedendo-se maior período de descanso e recuperação. Com isso, conjugam-se dois efeitos benéficos: menor tempo de exposição e maior tempo de recuperação” (Oliveira, SG, Proteção jurídica à saúde do trabalhador, 3ed, São Paulo: LTR editora ltda, 2001).

Na nossa legislação, professores se aposentam com 25 anos de trabalho, policiais aos 30, diplomatas têm lá suas benesses. Não é isso que propomos para nós nem para a sociedade. Somos contrários ao pagamento de adicionais que premiem o adoecimento com dinheiro ou aposentadoria especial. Defendemos que as jornadas de trabalho sejam adequadas ao grau de exigência das atividades. Não se pode exercer perícias médicas 8 horas por dia, é desumano!

A discussão sobre redução de jornada como forma de aumento indireto do salário e medida administrativa para reduzir o adoecimento e melhorar o atendimento precisa recomeçar sob nova direção, fundamentação e estratégia.
Jornada de trabalho é um ponto nevrálgico para médicos. Temos esse calcanhar de Aquiles. Todos que querem nos derrotar usam a impontualidade, causando-nos constrangimento e enfraquecendo todos os outros argumentos nobres da profissão. Quando foi facultado aos médicos jornada de 4 hs a medicina e os médicos eram outros. As instituições públicas precisavam avidamente de médicos que, na época, só se interessavam por suas atividades liberais muito rentáveis.

A realidade atual é bem diferente, os médicos são, em sua maioria, assalariados ou pseudo-liberais, quando, em seus consultórios privados, trabalham para grupos ou seguradoras de saúde. É fato notório que as carreiras jurídicas são muito mais valorizadas e isso, em parte, se deve a eles não terem outras carreiras gravitando em torno (tipo fisos, psis, nutris, aux de enfermagem etc), o que puxa pra baixo, e, em parte, por não caírem na cilada de 1/2 jornada. Na nossa própria instituição, eu mesmo trabalhei 16 anos em 20 hs para compatibilizar com 2 outros empregos. Hoje bato SISREF de 9 hs/dia. Os mais jovens na carreira não sabem, mas quando discutíamos a carreira a grande maioria dos peritos pleiteava extensão de jornada, mesmo para ganhar pouco mais de 2 mil reais por mês pelas 8 horas que, evidentemente, não cumpririam integralmente. Ainda nessa mesma instituição foi criada a carreira de Supervisor Médico-pericial em 1998. Virtualmente todos os SMP entraram com ação judicial para reduzirem a jornada oficial (40 hs) e muitos conseguiram. O resultado foi a extinção da própria carreira.

Lembro-me de alguns colegas que nunca quiseram carreira alguma, pois ficavam no INSS menos de 2 hs e se achavam muito bem pagos. Estes optaram pela nova carreira em sua totalidade!

Com a carreira estruturada e regulamentada em Lei, é natural que maiores compromissos e cobranças viessem. O contraponto aos deveres e cobranças existe, é remuneração e valorização. Não se fala separadamente de remuneração e jornada; um só tem sentido se referenciado no outro! Havendo contrapartida adequada, 40 hs não se apresentava como o maior dos problemas e talvez não o fosse hoje.

Nos primeiros anos da carreira evoluímos muito e a remuneração para o segundo concurso, o de 2006, já estava no patamar próximo dos auditores fiscais, graças à GDAMP. Se assim as coisas se mantivessem (progredindo), deveríamos estar ganhando de 14 iniciais a 24 mil. Acontece que as 2 gestões do Argolo foram desastrosas e a evolução da carreira travou, ou melhor regrediu muito. Neste novo cenário, aqueles que cometeram o erro de assinar um contrato que não poderiam cumprir vislumbraram um solução mais conveniente para si: reduzir jornada mantendo o salário. Outros, que não suportavam as condições de trabalho também o fizeram mesmo tendo interesse em permanecer 8 hs. A discussão leva mais em conta os interesses individuais do que as necessidades da carreira, o que não é bom, mas, como discussão, é bem-vinda. Gostaria que fossem debatidas propostas e suas implicações sobre a CARREIRA e não o que melhor atende A, B ou C.

Neste momento, a carreira está em baixa, beirando a extinção, e nosso papel é debate-la como um todo, evitando o reducionismo àquele aspecto que interessa particularmente a mim ou a você. Pensemos em todos para que todos usufruamos de uma carreira forte e perene! O longo prazo existe e o futuro chega!

Quais as perspectivas da carreira? Propomos nos integrar a outras de perfil similar, lutar por estarmos em um órgão independente, remunerados por subsídios (a GDAMP está superada). A jornada deve ser consequência desse debate com a sociedade e o governo que, no fim, serão quem apontará a jornada ideal ou a jornada possível diante de uma equação que inclui remuneração e valorização. Começarmos pela jornada é repetir o erro dos SMP. Caso fique claro para os dirigentes e para a categoria que a carreira acabou, lute-se para reduzir ao mínimo a jornada e cuidemos da vida lá fora, mas não seria uma diretoria sozinha que decidiria isso.

Integro um grupo de oposição à administração atual, patrimonialista, anti-democrática, legalista e fechada à categoria e ao mundo. Nunca agi desse modo, sempre valorizei e estimulei novas lideranças, sempre agi politicamente e não legalisticamente, sempre fomentei o debate. Não participei das últimas eleições porque achava que a ANMP precisava ter novos interlocutores, como pensava a categoria, traída por manobras eleitorais deploráveis. Mas nas próximas eleições estarei presente para que a mudança que não aconteceu (com graves consequências) aconteça agora. Pretendemos uma carreira forte e peritos que se orgulhem de integrá-la. Para tanto é necessário que participem e debatam entre si e com seus dirigentes todos os temas, inclusive (mas não principalmente) jornada de trabalho.

Essa resposta pessoal é de conhecimento e aprovação do grupo que integro por afinidade e ideais e não sinalizará com promessas eleitoreiras, revanchismo, intolerância, dogmas, estrelismo nem loteamento de cargos. Todos já perdemos muito e resta pouco a perder ainda mais. Nosso grupo é pelo debate democrático, pela atuação crítica e criteriosa tendo como baliza a previdência social pública e a CARREIRA da perícia médica. Repito, não temos dogmas nem posições imexíveis. Seremos uma diretoria que tolerará as divergências e construirá a partir delas, aguardem. Precisamos passar a borracha na última gestão e recomeçar como se ela nunca tivesse existido. Oportunamente uma chapa será anunciada e cada um de vocês está convidado a participar dela. Só adianto que serei um atuante colaborador da mesma. Ah, 8, 6, 4, 7 horas... a categoria decidirá soberanamente.

Vamos contratar estudo ergonômico da atividade médico-pericial do INSS. Primeira medida antes de debater jornada com o governo

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